Edson Penha Mendes
Militante dos Direitos Humanos.
Redação
No dia 3 de agosto, a Polícia Militar do Estado de Mato Grosso realizou o despejo do acampamento Cássio Henrique Ramos. O referido acampamento se localizava na fazenda, Rancho Verde, no município de Cáceres. Cerca de 300 famílias ocupavam a área desde o dia 14 de junho de 2011. Segundo informações do próprio INCRA a fazenda já dispõe de um laudo de vistoria que classifica a área como improdutiva. As famílias do acampamento Cássio Henrique Ramos, foram forçadas a saírem da área e jogadas no ginásio de esporte Didi Profeta, onde se encontram em condições desumanas.
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Famílias despejadas |
Segundo a Ficha Informativa n. 25 Rev. 1 das Nações Unidas em qualquer processo de desocupação forçada os custos humanos envolvidos são tão grandes que toda e qualquer justificação deve ser analisada num quadro de direitos humanos. Principalmente onde se encontram mulheres, crianças, jovens [...] grupos sociais com baixos rendimentos, populações em territórios ocupados e populações sem garantia jurídica de direito de ocupação, a tendência é sofrerem de modo desproporcionado as consequências da prática da desocupação forçada.
O que aconteceu na Fazenda Rancho Verde se enquadra neste contexto de violações. Nada justifica o aparato policial designada pelo governador do Estado de Mato para o despejo forçado dos trabalhadores e trabalhadoras acampados, moradores de Cáceres, que buscam apenas um pouco de dignidade para si e para seus filhos.
Mas, apesar do aparado todo, o que os policiais encontraram no local foi outra realidade. Encontraram um povo pacifico gente de bem, trabalhadores e trabalhadoras produzindo alimento na terra para dar o que comer para seus filhos. Encontraram cerca de 300 famílias pobres, moradoras de Cáceres. Crianças pálidas e mal alimentadas. Mulheres e homens, jovens e idosos, desempregados, doentes que ainda sonham com um lar para viver dignamente com os seus entes queridos.
Os Tratados Internacionais são unânimes em afirmar que os direitos humanos fundamentais das pessoas vítimas de desocupação forçada são violados quando, por exemplo, as crianças que não podem frequentar a escola, por motivo de desocupação, o direito à educação é sacrificado.
O mesmo acontece quando as pessoas perdem a sua fonte de trabalho, o direito ao trabalho é violado. Quando a saúde mental e a saúde física são afetadas pela ameaça constante de uma desocupação, estão em jogo questões relativas ao direito à saúde. Todas às vezes que famílias e comunidades são separadas pela desocupação, o direito à vida familiar é violado. Todas as vezes que a polícia entra na casa de uma pessoa, sem ser convidado e com recurso à força, o direito à privacidade e o direito à segurança do lar são violados.
Direitos humanos emergentes, como o direito de permanecer na sua casa ou terra e o direito a regressar a casa, no caso de haver uma desocupação forçada, são direitos que também podem ficar pelo caminho.
Os trabalhadores e trabalhadoras da Fazenda Rancho Verde foram vítimas das violações dos direitos humanos em três aspectos. Primeiro por serem vítimas da exclusão, da segregação social pela ausência do Estado. Outra pela presença do aparato repressor do Estado, promovendo medo e terror aos acampados. E, por último ao serem jogados em um lugar inapropriado à vida humana.
No Brasil, mesmo com os direitos garantidos no Estatuto da Terra (de 1964), na Constituição Federal (1988) e mais recentemente (em 1993) na lei nº 8.634, todos garantindo um direito à reforma agrária; ainda existem “terras presas” e agricultores sem a terra para trabalhar.
A lei número 4.504 de 1964 é conhecida como o Estatuto da Terra e no artigo segundo, parágrafo primeiro, garante que todos têm oportunidade de ser proprietário da terra, quando ao mesmo tempo, é respeitada a função social da terra, o que quer dizer: que satisfaça as necessidades dos trabalhadores, dos proprietários e de suas famílias; que tenha uma produção satisfatória; que não destrua a natureza, mas conserve o meio ambiente.
No contexto da Lei 4.504, a Fazenda Rancho Verde não vem cumprindo com a função social. Portanto, deve ser desapropriada para fim de reforma agrária, para atender os 39,02% de pessoas que se encontram em situação de pobreza, em Cáceres, segundo o IBGE.
A Constituição Federal de 1988 reforça o Estatuto da Terra quando fala de propriedade, no capítulo dos direitos fundamentais das pessoas (artigo quinto, inciso vinte e dois e vinte e três), garante a todos o direito de ser proprietário e dá ao estado a responsabilidade de fazer com que a terra cumpra a sua função social.
O artigo 186 da Constituição Federal diz que a função social da terra é cumprida quando atende ao mesmo tempo as exigências: aproveitamento correto da terra e do melhor jeito; uso de todos os recursos da natureza sem destruir o meio ambiente; que patrão e empregado cumpram as leis que regulam as relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Neste caso, vejamos, então:
a) Se o proprietário tem o DEVER de cuidar bem de sua terra, fazendo com que ela produza, e seja boa tanto para o dono quanto para os trabalhadores e ainda respeite o meio ambiente;
b) Se o governo tem o DEVER de desapropriar, isto é, tirar a terra do dono que não explora direito, para distribuir com quem ainda não é dono, mas que tenha o interesse para plantar,
c) Então, a constituição dá o direito ao povo de uma reforma agrária.
E se o governo, ou por falta de vontade, ou por pressão dos donos da terra, não cumpre seu DEVER de fiscalizar as terras que não produzem, para distribuí-las com os trabalhadores e trabalhadoras que nelas trabalham e querem produzir, então os trabalhadores e trabalhadoras devem se organizar para pressionarem o governo a fazer a reforma agrária. Inclusive ocupando o latifúndio improdutivo.
O artigo 184 da Constituição Federal garante que, quando uma propriedade não está cumprindo a sua função social, pode ser desapropriada pela união (governo federal) para reforma agrária.
Portanto, é preciso garantir aos trabalhadores e trabalhadoras o direito de ocupar a Fazenda Rancho Verde, por se tratar de uma terra improdutiva e por não cumprir a função social, como forma concreta de combater a pobreza e promover a inclusão social e produtiva, no município de Cáceres.